O Supremo Tribunal Federal, no ano de 2021, quando do julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade (ADI) 5.469 e do Recurso Extraordinário (RE) 1.287.019, ambos leading cases do Tema 1.093, decidiu pela inconstitucionalidade da cobrança do diferencial de alíquota do ICMS (DIFAL) daqueles contribuintes que comercializam mercadorias com destino a consumidor final situado em outro estado da federação. Entendeu-se, na ocasião, que a lei complementar federal, necessária para regulamentação do referido tributo, nos termos solicitados pela constituição federal no que diz respeito ao ICMS, não fora elaborada pelo Congresso Nacional, não sendo um convênio do Comitê de Política Fazendária (CONFAZ) meio adequado para a referida cobrança.
Àquela ocasião, o tribunal supremo fixou a seguinte tese: “A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais.”
O julgamento foi proferido em regime de repercussão geral: pelo teor da decisão, o Congresso Nacional disporia de alguns meses – hiato entre maio e dezembro de 2021 – para regulamentar a cobrança do tributo, haja vista que o STF fixou, como marco temporal para produção de efeitos da decisão, o ano de 2022. Ou seja, o DIFAL somente poderia ser cobrado em 2022 se houvesse lei complementar disciplinando a cobrança do tributo.
Neste cenário o Congresso Nacional, sob a tutela do Senador Cid Gomes (PDT/CE), apresentou o Projeto de Lei Complementar nº 32/2021, que altera a lei complementar nº 87/96 (Lei Kandir), incluindo, portanto, a cobrança do diferencial de alíquota de ICMS nas operações interestaduais envolvendo consumidor final. O Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 32/2021, apesar de aprovado pelo Congresso Nacional – em ambas as casas legislativas – não foi sancionado pelo Poder Executivo dentro do exercício fiscal de 2021, o que era esperado, tendo em vista a necessidade de respeito ao princípio da anterioridade tributária, insculpida na Constituição Federal.
A sanção do Projeto De Lei Complementar nº 32/2021 somente no ano de 2022 implica em impossibilidade da cobrança do diferencial de alíquota de ICMS (DIFAL) por todos os estados da federação, uma vez que a referida norma é pressuposto de validade das normas estaduais.
Importante relembrar que a anterioridade tributária, sob a ótica constitucional, divide-se em duas frentes: (i) anterioridade anual; e (ii) anterioridade nonagesimal (alínea “b”). Segundo a Constituição Federal, ambas devem ser aplicadas, em regra, de forma conjunta; ou seja: o tributo instituído ou majorado somente poderá ser cobrado no exercício financeiro seguinte (próximo ano calendário), acrescido de 90 (noventa) dias. São normas, via de regra, complementares, que se aplicam em conjunto, em somatório.
Sem embargo, é importante ressaltar que a anterioridade tem por embasamento a segurança jurídica, a proteção da confiança na lei, a exclusão da surpresa fiscal (não surpresa) e a garantia ao prévio planejamento das finanças do contribuinte, constituindo cláusula pétrea instituída em favor dos contribuintes (art. 60, §4º da CF/88).
Deste modo, devem os contribuintes buscar socorro judicial visando a abstenção dos estados na cobrança do diferencial de alíquota do ICMS.